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sábado, 29 de setembro de 2012

O verdadeiro pão tem alegria!



















O verdadeiro pão tem alegria!
Tem o saibo da terra e a luz do sol!
E é de todos!
E há-de acalmar a mão,
se é realmente o pão
da pele, dos ossos e do coração!

E depois dele há-de ficar no sangue
um desejo sem fim de amar a vida!
Mas amá-la na seiva, no mais fundo,
no mais branco do mundo,
lá onde ela se estrema, recolhida!

Há-de correr nas veias
uma onda de paz.
E as horas, depois,
longas e fundas como o azul do mar,
hão-de ser puras e de cada um.
A chorar,
a sorrir,
cada qual há-de poder passar,
e chegar,
se tinha verdadeiramente onde ir!

Pelas noites mais vastas e desertas,
quando se gera orvalho e nascem flores,
– Os rouxinóis que fazem, Senhor Homem?
Comem?
– Não: cantam os seus amores!

Miguel Torga, in “Lamentação”, Coimbra, 1970 (3.ª edição)

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