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sábado, 25 de julho de 2015

[As palavras da poesia], registo de João José Cochofel

Foto encontrada em http://cvc.instituto-camoes.pt/
Lisboa, Dezembro de 1948

É sempre um prazer ler os jovens poetas. Ao lado da inexperiência, quantas vezes mesmo da ingenuidade, há quase sempre a contar com uma frescura e uma espontaneidade tocantes, nas reacções às solicitações da vida e do meio. E torna-se apaixonante verificar como a aventura poética se processa nestes seus obscuros comparsas, em quem geralmente se deixa surpreender com maior transparência.
Mas esta sedução tem o seu reverso. A poesia não é apenas exposição de sentimentos e ideias: é fundamentalmente a sua formulação literária. E, para tanto, tem o poeta que lutar com a floresta das palavras, tem que vencer a resistência da sua inércia, tem que as amoldar, que adaptá-las, por assim dizer, ao seu caso, já que a aventura poética, tal como a experiência psicológica, não se repete e é única para cada indivíduo, devendo, para que se lhe reconheça autenticidade, corresponder-lhe uma expressão própria. É nesta luta com a matéria, neste esforço operário, que o poeta realmente se forja, libertando-se das suas dores, comovedoras sem dúvida pela sinceridade, mas em si mesmas insignificativas, e afeiçoando a voz, para que o canto lhe saia nítido, pessoal e bem timbrado.

In «Opiniões com Data», João José Cochofel, Obras Completas [de] João José Cochofel, Editorial Caminho, Lisboa, Outubro de 1990.

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